A série de livros de André Luiz, muito lida no movimento espírita, tem no volume "Sexo e Destino" uma abordagem que merece reflexão. Trata de um fenômeno também referenciado em outras obras: a reversão. Basicamente, a reversão ocorre quando um Espírito encarna por longo tempo numa polaridade sexual e, por contingências cármicas, retorna à experiência terrena em corpo não correspondente a essa polaridade. É dos fundamentos do Espiritismo que o Espírito não tem sexo, podendo vincular-se a um corpo de homem ou de mulher, indistintamente. No entanto, tal ensinamento (como, ademais, todo ensinamento) não deve ser tomado à conta de valor absoluto, que pretenda, de uma só penada, abarcar miríades de circunstâncias fáticas e específicas da Vida de cada ser. Equivale a dizer que o Espírito, em essência, não tem sexo, o que não impede do ser adquirir extremo traquejo na vivência de um dos pólos por assumir-lhe a compleição e comportamento, longamente, em repetidas jornadas encarnatórias. O que vale para o pólo masculino, por óbvio, vale para o pólo feminino. Ainda por outro lado, consoante a Psicologia mais recente, há ainda os transexuais, entendidos como o homem com "alma feminina" ou a mulher com "alma masculina". Diferem do homossexual "clássico", bem como dos bissexuais, por não optarem por uma ou outra conduta sexual, experienciando-lhe o prazer conquanto também possam, querendo ou não, atuar na esfera intrínseca de sua fisiologia. Bem recentemente, noticiou-se que a Saúde Pública vai cobrir operações de mudança de sexo, desde que sob rigoroso acompanhamento psicológico e psiquiátrico, a fim de bem diagnosticar a transexualidade e a livre opção do indivíduo pela aguda cirurgia. Enfim, o tema é, por si só, riquíssimo e não comporta maior análise neste espaço.
Mas queremos destacar o que diz André Luiz sobre a homossexualidade:
Tendo Neves formulado consulta sobre os homossexuais, Félix
demonstrou que inúmeros Espíritos reencarnam em condições
inversivas, seja no domínio de lides expiatórias ou em obediência
a tarefas específicas, que exigem duras disciplinas por parte daqueles
que as solicitam ou que as aceitam. Referiu ainda que
homens e mulheres podem nascer homossexuais ou intersexos,
como são suscetíveis de retomar o veículo físico na condição de
mutilados ou inibidos em certos campos de manifestação, aditando
que a alma reencarna, nessa ou naquela circunstância, para
melhorar e aperfeiçoar-se e nunca sob a destinação do mal, o que
nos constrange a reconhecer que os delitos, sejam quais sejam, em
quaisquer posições, correm por nossa conta. À vista disso, destacou
que nos foros da Justiça Divina, em todos os distritos da
Espiritualidade Superior, as personalidades humanas tachadas por
anormais são consideradas tão carecentes de proteção quanto as
outras que desfrutam a existência garantida pelas regalias da
normalidade, segundo a opinião dos homens, observando-se que
as faltas cometidas pelas pessoas de psiquismo julgado anormal
são examinadas no mesmo critério aplicado às culpas de pessoas
tidas por normais, notando-se, ainda, que, em muitos casos, os
desatinos das pessoas supostas normais são consideravelmente
agravados, por menos justificáveis perante acomodações e primazias
que usufruem, no clima estável da maioria.
E à ligeira pergunta que arrisquei sobre preceitos e preconceitos
vigentes na Terra, no que tange ao assunto, Félix ponderou,
respeitoso, que os homens não podem efetivamente alterar, de
chofre, as leis morais em que se regem, sob pena de precipitar a
Humanidade na dissolução, entendendo-se que os Espíritos ainda
ignorantes ou animalizados, por enquanto em maioria no seio de
todas as nações terrestres, estão invariavelmente decididos a
usurpar liberalidades prematuras para converter os valores sublimes
do amor em criminalidade e devassidão. Acrescentou, no
entanto, que no mundo porvindouro os irmãos reencarnados, tanto
em condições normais quanto em condições julgadas anormais,
serão tratados em pé de igualdade, no mesmo nível de dignidade
humana, reparando-se as injustiças assacadas, há séculos, contra
aqueles que renascem sofrendo particularidades anômalas,
porquanto a perseguição e a crueldade com que são batidos pela
sociedade humana lhes impedem ou dificultam a execução dos
encargos que trazem à existência física, quando não fazem deles
criaturas hipócritas, com necessidade de mentir incessantemente
para viver, sob o Sol que a Bondade Divina acendeu em benefício
de todos.
(Sexo e Destino - páginas 171/172)
O texto remonta a 1963 mas é, ainda, bem atual. Sem moralismos escorchantes, evidencia que os seres humanos homossexuais, assim como os que de alguma forma diferem da heterossexualidade "clássica", são Espíritos com a mesmíssima qualificação evolutiva de qualquer outra pessoa. Por óbvio, não abrangemos, aqui, as pessoas que, no exercício de seu livre-arbítrio, tenham por bem experimentar variantes de conduta sexual por mera curiosidade, ou pelo simples cultivo de sensações outras, em busca do aviltamento de seu potencial sensorial. Ecoamos (humildemente) com André Luiz quanto aos seres humanos que, por contingências muitas vezes inconfessáveis, necessitam de uma inversão abrupta no processo que, em águas serenas, ocorreria sem reverberações adaptativas do impulso ainda indisciplinado.
O que importa destacar é que todos os seres humanos não heterossexuais são nossos irmãos de jornada e merecem todo o nosso respeito e, sempre que fizerem por merecer (tanto quanto qualquer outro), devem receber a nossa admiração sem quaisquer nesgas de preconceito.
"Quem estiver sem pecados, que atire a primeira pedra..."
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